Lorenzo Kom’boa e lições para a luta antirracista em Patos de Minas

Em seu livro 'Anarquismo e Revolução Negra', pensador e combatente negro diz como proceder na luta antirracista

Em Patos de Minas, o debate sobre racismo nunca ocupou um papel de destaque na cena pública, exceto no meio universitário – mas de todo modo, o debate nunca foi feito de maneira sistemática e persistente. Estas discussões nunca sobreviveram para além de datas específicas, como o dia da consciência negra e tampouco as escolas cumprem com rigor a lei que diz sobre a obrigatoriedade do ensino de cultura afrobrasileira. Se conversar e discutir estes problemas já é difícil, quem dirá pensar em organizar uma luta antirracista no município. Mas o que não falta são referências de luta que nos indicam como proceder, e Lorenzo Kom’boa, pode se dizer, é uma destas referências ainda que pouco conhecida.

O anarquista negro tem experiência na luta: já esteve preso, exilado e pertenceu ao partido dos Panteras Negras. Homem de poucas palavras e muita ação, em seus livros é possível extrair lições para uma luta antirracista e pensar estratégias para organizar núcleos de defesa no município. Embora não exista muitas informações a respeito, dados do IBGE apontam para uma população formada por 41% de pessoas não brancas em Patos de Minas – daí a necessidade de auto-organização para defesa dos interesses dessa minoria política.

Talvez a principal lição dada por Kom’boa seja a importância de buscar formas de resistência no âmbito comunitário, com trabalho de base feito por meio de coletivos e comunas de bairro, abandonando assim, a tradicional luta por meio da representação política institucional. Criar comunas geridas por meio de uma economia de subsistência – coisa que já acontece, a exemplo de hortas comunitárias – são ações importantes para uma pequena revolução, segundo o estadunidense. E a importância dessas comunas é muito mais que econômica, é uma verdadeira resistência contra o capitalismo, sistema que contribui com a perpetuação do racismo.

Além da (re) organização econômica, a ação por meio de protestos e boicotes são outras estratégias apontadas por Kom’boa. Estes protestos são formas de escancarar a insatisfação da população negra com a política vigente ou denunciar situações de abuso e violência policial, mas também servem de mecanismo para a união de massas negras em prol da mesma luta.   Pensar todas estas ações para o nosso município é urgente, visto situação da luta negra por aqui. Apesar do empenho  e da liderança do Movimento Negro Unificado, ainda falta um projeto mobilizador e combativo. Esse elemento ausente talvez seja justamente as ideias anarquistas propostas por Lorenzo.

Por mais que a realidade local seja diferente da situação das grandes cidades, não nos deixemos enganar, pois o racismo vigora do mesmo jeito por aqui, seja da maneira cordial, ou na sua forma mais virulenta, como ficou explícito no caso da estudante de Direito negra chamada de macaca e ameaçada pela colega no início deste ano. Neste caso, pouco foi feito e a estudante  racista voltou às aulas logo depois da suspensão de duas semanas.

Não se contentando apenas com sua realidade e conhecedor da situação opressiva em que se encontra a população negra em todo o mundo, Komb’boa também pensou numa união nacional por meio da federação de comunas independentes, e também em uma união internacional, chamada por ele de intercomunalismo. Esta união não deveria ser estabelecida somente entre negros e minorias étnicas, mas sim entre todas as classes oprimidas, pois enquanto existir discriminação, toda a classe trabalhadora permanecerá oprimida também.

Já refletindo sobre este intercomunalismo proposto por Kom’boa, por que não pensar em uma união regional dos movimentos negros da nossa região? Para ele, com muito empenho, isto é possível, bastando não acomodar-se na luta. Muitas destas e outras ideias, podem ser extraídas do seu principal livro, ‘Anarquismo e Revolução Negra’, publicado pelo coletivo Sunguilar. E mesmo sem o ardor combativo, revolucionário e anticapitalista, característico dessa figura incansável, qualquer um que pense em movimentar-se contra o racismo, pode obter lições com Lorenzo Kom’boa.

2 comentários

  1. Foram elencados os principais pontos de partida para se travar a tão desejada luta em favor do povo negro e por que não de outras causas igualmente relevantes. Quando me pergunto onde está o motor de arranque, o vejo aqui. Também.

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