JK: a avenida que exclui, atropela e mata em Patos de Minas

Falta de infraestrutura adequada na Avenida JK escancara a negligência do poder público e revela um modelo de cidade que privilegia o fluxo veloz de veículos em detrimento da vida das pessoas

A cada dia, mais vidas desaparecem na avenida JK — principal ligação entre a entrada de Patos de Minas e o centro da cidade. Apenas nos últimos meses, motociclistas jovens têm morrido em acidentes diversos: capotamentos, invasão de canteiro central, colisões múltiplas etc. 

Na última semana, um deles, Matheus Ferreira, de apenas 30 anos, perdeu a vida ao invadir o canteiro e ser arremessado, conforme noticiou a imprensa local. Em janeiro deste ano, um motociclista atravessou o canteiro central e perdeu a vida após atingir um poste no mesmo trecho em que Matheus faleceria meses mais tarde. Em outubro do ano passado, outro motociclista caiu sob chuva intensa e foi atropelado. Mas não apenas motociclistas se envolvem em acidentes na avenida. Em junho deste ano, dois carros colidiram, deixando dois motoristas feridos, felizmente sem gravidade. Em agosto do ano passado, duas pessoas morreram e duas ficaram feridas após um carro capotar e se chocar contra um muro e uma árvore. São inúmeros os casos.

O cotidiano da avenida Juscelino Kubitscheck expressa uma fatalidade repetida: trecho de quase cinco quilômetros, limite de 60 km/h, raramente respeitado, sem semáforos, sem travessias elevadas ou nem mesmo faixas de pedestre. Para atravessar de bairros como Ipanema e Planalto para Céu Azul, Gramado e Jardim Andrades ou vice-versa, os moradores muitas vezes arriscam suas vidas, a pé ou de veículo.

A prefeitura limita-se a instalar radares (alguns deles ainda em implantação) e colocar cartazes alertando “Desacelere, sua vida é mais importante”. A culpa, segundo se lê na imprensa local, estaria exclusivamente na “imprudência” dos motociclistas e motoristas. Mas esse discurso moralizante desvia o foco da responsabilidade institucional da prefeitura. 

A JK é um laboratório de exclusão e, enquanto isso, a prefeitura aposta no moralismo e em medidas paliativas: placas que apelam à “consciência” do motorista e radares de 60km/h. Mas consciência não faz atravessar pessoas em segurança, não impede motoristas e motociclistas de capotarem em alta velocidade, não reduz velocidades se não houver infraestrutura adequada. E os radares se mostraram, até aqui, insuficientes para conter os acidentes ou garantir travessias seguras. Sem faixas de pedestres, sem semáforos, sem travessias elevadas ou lombadas bem posicionadas, as medidas ficam mais no campo simbólico e o resultado é o que temos visto: tragédias.

O projeto viário da JK (pensado para carros e alta velocidade) ceifa vidas, atropela o convívio urbano e ignora o direito de ser pedestre, ciclista, morador. Patos de Minas paga um preço muito caro por esse modelo.

Para a urbanista Raquel Rolnik, a cidade deveria ser um espaço construído pelas pessoas e para as pessoas — e não um ambiente em que elas sirvam como vassalas de uma estrutura urbana cruel e excludente. Ela defende uma abordagem de urbanidade e cidadania, em que todo espaço público seja pensado como lugar de convívio — e não apenas de passagem de veículos. Nesse sentido, políticas urbanas deveriam garantir acesso real à mobilidade, à habitação e à participação coletiva, mesmo dentro dos limites estruturais do capitalismo.

Precisamos propor ações concretas: viadutos, semáforos, redutores de velocidade bem planejados, sinalização visível, iluminação intensa, travessias elevadas nos pontos mais críticos. Construir calçadas contínuas, faixas de pedestres e ciclovias nas margens; reforçar fiscalização eletrônica. E, mais que tudo, abraçar a cidade como espaço de vida.

Sem infraestrutura adequada, depender da “boa vontade dos motoristas” torna-se missão impossível — especialmente levando-se em consideração que, em sua maioria, são trabalhadores exaustos que percorrem a via em horários de pico voltando para suas casas ou acelerando suas motos para fazerem o maior número de entregas possíveis a fim de receberem uma remuneração minimamente digna de seus empregos uberizados. 

Em resumo, a JK revela um Estado que planeja para carros, repete propostas simbólicas e ignora o direito à cidade de quem nela vive. Precisamos disputar esse espaço com força: mobilizar moradores, cobrar vereadores, construir coletivamente propostas urbanas. Como Rolnik lembra, espaço público é espaço de todos. E o direito à cidade é também um direito à vida.

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