A seguir publicamos um artigo de Caio Machado sobre o Ocupa Guiomar, que no mês passado, completou seu quinto aniversário. O artigo foi originalmente publicado no Patos Notícias, em 01 de novembro de 2016, na coluna opinião. Vale destacar o mérito de Caio, que foi o único jornalista, na imprensa burguesa, com inteligência e sensibilidade para destacar a força e originalidade daquele acontecimento na política local.
Por Caio Machado
A ocupação da Escola Estadual Dona Guiomar de Melo já dura mais de 24 horas e o que vemos na cidade é o mesmo discurso de ódio repetido país afora. A maior adversidade entre a sociedade e os estudantes é a de julgá-los incapazes de estarem ali para manifestar por supostamente desconhecerem profundamente a PEC 241.
A primeira coisa que me vem na cabeça é “caramba, os estudantes estão reivindicando contra uma emenda constitucional que congelará investimentos na educação e são tratados como ignorantes?”. Trocando em miúdos: os alunos lutam contra uma causa que possivelmente prejudicará o ensino e a sociedade enxerga isso como algo ruim.
Até aí tudo bem. Temos inúmeros vídeos de alunos de escolas ocupadas pelo país sendo entrevistados e não fazendo a menor ideia do motivo de estarem ali. Eu mesmo estive nas imediações da E.E. D.ª Guiomar de Melo e percebi certo ar de desinformação pairando pelas cabecinhas de alguns dos estudantes. Porém a questão é outra.
Mesmo que os alunos ainda estejam engatinhando na formação de um pensamento crítico e politizado, será em ações como essas que o real interesse no assunto despertará e amadurecerá. Não dá para esperar que um país com a educação pública amplamente sucateada nos apresente prodigiosos cientistas políticos de quinze anos de idade.
E não podemos esquecer que foi em junho de 2013 que os brasileiros começaram a preencher as ruas para manifestar contra o aumento do preço da passagem de ônibus e, posteriormente, contra a Presidente da República já deposta. Se o “gigante não tivesse acordado”, não haveria sequer Michel Temer propondo a PEC 241 e a medida provisória da reforma do ensino médio repudiada pelos estudantes.
O país não fazia algo do tipo desde a era Collor e os caras pintadas. Três anos de manifestações é muito pouco para saber lidar com a enxurrada de críticas que os jovens andam recebendo. É incrível notar que o principal motivo que mantém esse assunto em alta na cidade é a briga sem fim entre “direita” e “esquerda” nas postagens do Facebook e em portais de notícias locais.
O pano de fundo real do contexto fica de lado e as ofensas medíocres ganham cada vez mais força. Não vim aqui puxar sardinha para nenhum lado. Confesso, sinto-me romantizado pela esperança de mudanças que tive após assistir o belo discurso da estudante paranaense Ana Júlia, que, com apenas 16 anos, desmoronou meia dúzia de deputados no Paraná e viralizou no Brasil.
Ao mesmo tempo, percebo que as ocupações podem prejudicar a agenda de estudantes que estão dando duro para prestar o ENEM no fim de semana. Aí paira outra crítica que vem sido repetida exaustivamente: “Enquanto isso, nas escolas particulares, os alunos estão tendo aulas aos sábados e domingos para reforçar o ENEM”. Sério, isso é um argumento? Esse mesmo pessoal ainda consegue defender a meritocracia?
Os professores da rede pública estão desmoralizados e recebem salários irrisórios. As escolas fornecem o mínimo de estrutura aos alunos. O desinteresse dos estudantes é quase inacreditável, o que basicamente justifica o tamanho descrédito da sociedade perante as ocupações. É um beco sem saída. E na minha modesta e singela opinião, ao máximo que posso ser de imparcial, censurar e cessar as manifestações é andar de ré.
Eu penso no cenário todo como uma “escola” para que esses alunos e futuros profissionais e até mesmo políticos, sintam que o papel deles nas ocupações, na confecção de um cartaz que seja, possa torná-los cidadãos melhores e participativos. Estamos construindo uma sociedade pensante, que, até pouco tempo, nunca imaginou que veria políticos presos e a líder máxima da nação impedida.
O debate aqui não é partidário, como relutou a brilhante Ana Júlia aos prantos em sua fala na semana passada. A pauta discutida é a Educação. Será que Patos de Minas consegue deixar o conservadorismo interiorano e o julgamento de lado por um instante que seja, e enxergar o contexto inteiro?